segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Austeróbilo (O Início)

Querido Austeróbilo*,

Reavaliei minha vida hoje. Senão minha vida, meu corpo. Descobri que faço parte de uma minoria desgraçada. Sou gordo. Não me entenda mal, ser gordo não é, de longe, um problema. Problema é o que vem 'de graça' ao ser visto como gordo. Ser gordo é ser considerado simpático e hilário, mas do tipo que compensa rejeição social, com piadas e gentilezas. Não existem gordos felizes ou gordos cafajestes. São apenas gordos. E suas vidas são determinadas pelo 'mundo', literalmente, ao seu redor.


Nós, gordos, não somos julgados por nossos comportamentos e culturas, mas pelos olhos que nos veem. Hoje, sou convencido que todo gordo é feio. O máximo que atingimos é um 'mas tem um rosto bonito’ (vale ressaltar o 'mas'). Claro, isso, se for pobre. É fato que rico bonito é uma redundância, independente de sua circunferência. De que outra forma Fausto Silva seria casado com uma modelo loira? Ou existe outro motivo para uma mulher suportar toda vez que tenta completar uma frase, ouvir um 'ô, louco, meu', no pessoal e no profissional?

Mais destrutivo que isso, só a idéia de que os gordos são assexuados. Nenhum de nós é desejável, de forma alguma. Por certo não conhecem uma prima minha, que no alto da sensualidade de seus 107kg, é conhecida por toda a Torcida Jovem do Sport. E basta que ela passe, para que eles levantem a ôla.

Confesso que nunca fui de dietas. Odeio frutas, verduras e matos afins. Então nem me arrisco. Acho graça ao ver os que tentam substituir refeições, por exemplo. Daqueles que deixam de comer os velhos dois pratos no almoço e já fazem muito ao 'enrolar' com um mísero ovomaltine e uma bomba de chocolate. A redução alimentar, então, é a melhor. Sujeito chega e pede um, apenas um mísero, chese-bacon-rosbife-burger com fritas (porque o normal seria ele comer três) e completa na maior cara de geração saúde 'e uma coca light, por favor'.

Não me arrisco também em academias. Não suporto esse bando de marombeiros. Não tem jeito, para mim, o corpo é esculpido às custas do atrofio do cérebro. E só a idéia de ter uns três seres destes sorrindo e olhando enquanto o gordo se estica todo nas máquinas é inconcebível. Estudei muito na minha vida para terminar servindo de palhaço.

O que mais me impressiona quando decidimos fazer dieta é o fato de termos nossa vida limitadas à alimentação. Normalmente, instaurado o ócio, planejamos o que vamos fazer mais tarde. 'Acho que vou pegar um cinema' ou 'Vou visitar fulano'. Em dieta, não tem jeito. Estamos de manhã pensando 'o que eu vou comer no almoço?' ou 'será que vou ficar com fome?'.

Austeróbilo, nesse momento Oprah, decidi mudar de vida. Decretei dieta urgencial. Perdoe-me se nos próximos dias vou maldizer tudo e todos. Perdoe-me se meu sarcasmo atingirá o limite do bom gosto. Perdoe-me as grosserias. Mas se para ti já sou feio, pobre, palhaço e assexuado, agora já também não como. Tenho direito de pelo menos mandar-te à...

*Não tenho coragem de começar com o velho 'Querido Diário'. Já não basta o ato de manter um diário, em si, um tanto quanto gay. Por isso, direi que produzo relatos diários de um cotidiano, como uma carta a um amigo. Então, preciso de um nome forte, simples e corriqueiro: Austeróbilo. É isso. Afinal, todo mundo tem um amigo Austeróbilo, filho de pais criativos (que deveriam ser extintos).

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